“Essa história de que dinheiro não dá felicidade é um boato espalhado pelos ricos para que os pobres não tenham muita inveja deles”.
J. Benavente Y Martinez, 1866-1954
Dramaturgo espanhol
Se você passou com sucesso por todas as etapas anteriores da conquista de um novo trabalho descritas até aqui, está de parabéns. Superou uma maratona que exigiu grande empenho, dedicação e autoconhecimento. A empresa o escolheu como o candidato ideal para a vaga aberta? Então agora é a vez de negociar seu pacote de remuneração, o que será feito provavelmente com algum executivo da organização – um vice-presidente, diretor ou gerente de recursos humanos. Geralmente, esse é um momento tenso e de grande expectativa, especialmente quando o profissional não fez o seu dever de casa, ou seja, procurou se informar, pesquisar e estudar sobre o seu verdadeiro valor no mercado de trabalho. Consequentemente, acaba sendo comprado a um produto genérico, que pode ser igualmente eficaz e muito mais barato, mas não tem fama ou prestígio.
Quando você “vende” a sua “marca” abaixo do real valor de mercado, a empresa sabe que não necessitará lhe oferecer oportunidades mais interessantes para mantê-lo em seus quadros, nem uma trajetória dinâmica em sua carreira. Basta oferecer apenas algumas ninharias que você ficará satisfeito. É o que acontece na estória dos dois leões de um importante zoológico. O primeiro, velho e cansado, passava o dia inteiro em sua jaula dormindo. O segundo, jovem e de uma disposição inigualável, dava espetáculos para os seus visitantes. Diariamente o tratador do zoológico visitava os dois leões e jogava um suculento pedaço de carne para o leão mais velho que mal podia devorá-lo. E, para o segundo, atirava um cacho de bananas.
Certo dia, o leão jovem inconformado com tamanha discriminação, abordou o tratador e questionou-o a respeito de sua conduta injusta. Para o leão velho que mal podia ficar de pé e comer, ele o alimentava com um excepcional pedaço de carne. E para ele, que divertia todos os dias os visitantes do zoológico, atirava um cacho de bananas. O tratador não se deixou intimidar e respondeu: “Você foi contratado para fazer o papel de um macaco e não de um leão”. Essa é a razão porque o alimento com um cacho de bananas todos os dias.
Caro leitor, para qual posição você quer ser contratado – para a posição do leão ou a do macaco? Se for para a do leão, nunca permita que uma organização, por mais renomada que ela seja, pense que é fácil recrutá-lo por um preço bem inferior ao praticado pelo mercado – algo em torno de 30% –, simplesmente porque você está em transição de carreira. Valorize a sua marca, o seu bem mais valioso.
Reconheço que muitos profissionais não têm recursos financeiros suficientes para se manter por muito tempo sem um emprego formal. Eles necessitam desesperadamente se recolocar no mercado de trabalho.
Nessas circunstâncias, não há muito que eles possam fazer. Foram imprevidentes, visto que não se prepararam para os dias de adversidade. Portanto, eles têm de aceitar a primeira oferta de trabalho que surgir, mesmo que o salário seja um cacho de bananas. Essa é uma péssima posição por ocasião de uma negociação salarial. O profissional não tem poder de barganha e também não tem como valorizar a sua marca.
Isso me faz recordar de projeto de transição de carreira que empreendi visando a recolocação de um profissional para a posição de diretor de importante empresa multinacional. Sua vida financeira era invejável e a antítese da vida de profissionais imprevidentes. Ele simplesmente poderia deixar de trabalhar aos 52 anos se assim o desejasse. Amparado pela sua segurança financeira e qualificações profissionais, ele me disse: “A essa altura da minha vida, não desejo encontrar um novo emprego. Eu preciso de um desafio maior do que todos aqueles que encontrei até o presente. Se não o encontrar vou fazer outra coisa totalmente diferente. Eu poupei a vida inteira para conquistar a minha independência”.
Passados três meses do início de sua transição de carreira, oportunidade em que participou de doze projetos seletivos diferentes, foi contratado por uma das maiores empresas farmacêuticas instaladas no país. Recebeu uma oferta salarial 25% acima do que recebia no emprego anterior, um automóvel no valor de R$ 120 mil com todas as despesas pagas, seis meses de bônus, além de inúmeros benefícios.
A negociação de um pacote de remuneração deve levar em consideração os seguintes passos:
1 – Identificação pormenorizada de suas reais necessidades
Um dos maiores e mais graves erros praticados por profissionais durante a avaliação de uma oferta de trabalho é que não levam em consideração suas próprias necessidades. Eles pesquisam tudo sobre a companhia, as responsabilidades e desafios da posição e o pacote de remuneração e benefícios a serem oferecidos. Contudo, dão pouca atenção às suas prioridades. Sim, eles podem e devem avaliar o que desejam obter com a contratação – dinheiro, novos desafios, oportunidade de crescimento, reconhecimento etc – porém, eles não definem qual desses desejos devem ocupar os lugares preponderantes.
Nesse sentido, vale repetir as palavras de advertência da consultora norte-americana de carreira, L. Michelle Tullier, Ph.D.: “Cuidado! Na euforia de obter uma oferta de trabalho, é muito fácil relaxar por ocasião da avaliação ponderada da oferta salarial. Não permita que a satisfação que comumente acompanha a oferta de trabalho turve o seu bom julgamento. Veja se verdadeiramente a oferta é o que aparece ser”.
2 – Examine atentamente a oferta recebida
Tenho visto muitos profissionais vibrarem de alegria com ofertas de emprego para, semanas depois, descobrirem que não passavam de verdadeiros presentes de grego. Ou será que você não conhece ou nunca ouviu esse tipo de história? Esse tipo de situação ocorre geralmente por duas razões: eles não examinaram atentamente os prós e os contras da oferta e não procuraram obter maiores e melhores informações sobre o assunto. Nesse caso, a complacência é desastrosa para muitos profissionais.
3 – Compare a oferta recebida com as suas reais e verdadeiras prioridades
Todo profissional que assessoro recebe de mim uma advertência em relação à essa situação. Logo no primeiro dia de assessoria, recomendo que elabore seu orçamento familiar de maneira detalhada. Esse exercício irá ajuda-lo tremendamente quando estiver ao redor de uma mesa de negociação. O profissional é capaz de visualizar as suas necessidades de maneira lúcida, objetiva, justa e flexível.
4 – Procure negociar o melhor pacote de remuneração possível
Muitas vezes é difícil para um profissional melhorar o seu pacote de remuneração no futuro caso tenha aceito na sua admissão um salário inferior. São raríssimos os que alcançam tal façanha. Portanto, lembre-se sempre: você foi contratado para uma posição de leão ou de macaco? Nenhum profissional necessita aceitar a primeira oferta feita por uma empresa. Há possibilidade de incrementá-lo. Existem vários princípios que podem orientá-lo a esse respeito:
- Seja você mesmo. Evite qualquer postura que sinalize sua arrogância ou espírito de subserviência;
- Faça o seu dever de casa. Estude o assunto em profundidade;
- Aborde a negociação com o sentimento de que ambas as partes devem ganhar – “Ganhar X Ganhar”;
- Seja justo, verdadeiro, flexível e negocie mais do que o salário simplesmente etc.
5 – Tome a melhor decisão possível
Para que você tome uma decisão sábia é importante que você empreenda o seguinte exercício:
- Avalie sem pressa a oferta salarial. Não deixe nada de fora da sua análise;
- Solicite orientação de seu consultor de carreira;
- Averigue se a oferta de salário o satisfaz plenamente;
- Faça comparação com a sua remuneração anterior.
Além disso, profissionais em transição de carreira quando chamados para a negociação de seu pacote de remuneração devem ter em mente os seguintes segredos, segundo o escritor e consultor norte-americano de carreira, Richard Nelson Bolles:
- Nunca discuta sobre salário até a formal finalização do processo seletivo, ou seja, até ouvir da empresa a frase “você é o profissional que desejamos contratar”;
- O propósito da negociação salarial é desvendar o quanto a empresa está disposta a pagar para tê-lo como um de seus colaboradores;
- Durante a discussão sobre o salário nunca seja o primeiro a mencionar a cifra desejada;
- Antes de se dirigir para a empresa a fim de negociar o seu salário, faça uma pesquisa sobre o assunto em seu campo de atividade e segmento em que a empresa atua;
- Defina a faixa salarial que a empresa tem em mente e, então, considere uma faixa inter-relacionada para você mesmo;
- Saiba a hora de concluir a negociação salarial. Nunca a deixe pendente. (What Color Is Your Parachute? A Practical Manual for Job-Hunters and Career- Changers, 2012).
Caro leitor, esse é um assunto delicado, complexo e que exige uma capacidade de negociação invejável. Portanto, quanto mais preparado você estiver, melhor para você e a organização contratante. Nesse quesito, não seja um amador.