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A demissão é uma benção divina

Gutemberg B. de Macedo

Gutemberg B. de Macedo

Uma história de 40 anos de atuação no mercado, que se solidificou em uma empresa nacional, com filosofia e estratégias globalizadas.

Por Gutemberg B. de Macedo

“Empreender uma carreira de sucesso depende das respostas que damos àqueles eventos que acontecem conosco ao longo do caminho, inclusive, a demissão”.

Converse com qualquer profissional demitido sobre seus sentimentos pós-demissão e ouvirá, inevitavelmente: “No primeiro instante, você fica chocado, paralisado, confuso, descrente, impotente, inseguro, frustrado, traído, revoltado, rejeitado e, por vezes, experimenta até mesmo certo tipo de depressão. Entretanto, à medida que você recupera sua racionalidade, coloca todas as suas emoções em ordem e sob controle, toma consciência de que o trabalho não é a sua vida e que existe vida além de um “box” no organograma de uma organização, por mais importante que ela seja. A demissão se torna o mais benéfico e transformador evento da vida de um profissional”.

Esse depoimento resume as reações e sentimentos de centenas de executivos, famosos ou não, tanto brasileiros quanto estrangeiros.

Como consultor especializado na área de Outplacement, tenho assistido presidentes, diretores e gerentes das mais diferentes empresas multinacionais e nacionais ao longo dos últimos 34 anos. Além disso, tenho estudado, pesquisado, conversado, questionado e pensado profundamente, sobre os fatores, causas e consequências – positivas ou negativas –, que compõem o processo de demissão de executivos ou profissionais de alto nível. A minha conclusão expressa em inúmeros trabalhos – livros, artigos e palestras –, não difere do depoimento já mencionado. – “A demissão se torna o mais benéfico e transformador evento da vida de um profissional. E verdadeiramente um presente divino”.

Entretanto, tenho de admitir que poucos profissionais tiram proveito dos benefícios dela decorrentes. Muitos se recusam a parar para pensar sobre os motivos da demissão, as mudanças que precisam empreender em relação a seu estilo gerencial, hábitos que necessitam cultivar, aprendizados e saberes que precisam incorporar, novas competências que demandam desenvolvimento, etc. Eles preferem dar continuidade à carreira, como se tudo continuasse da mesma maneira.

Recentemente, fui procurado por executivo demitido de importante empresa multinacional que desejava conhecer os serviços profissionais de outplacement da Gutemberg Consultores. Ouvi, atentamente, sua história profissional e os motivos de sua demissão, que não coincidiam com as informações coletadas com seu ex-empregador: “profissional inábil politicamente e incapaz de se relacionar com pessoas que divergem de sua maneira de pensar” –, entre outros motivos.

Aproveitei essa oportunidade para dizer que o processo de outplacement exige um posicionamento diferenciado, uma mente aberta para ouvir coisas que dificilmente ouviria em uma empresa, repensar inúmeras questões associadas à carreira, etc. e que essas iam muito além do preparo para a recolocação no mercado de trabalho, como: levantamento de dados para confecção do Curriculum Vitae, aprendizado sobre técnicas de entrevista, negociação salarial, entre outras questões, também importantes.

O profissional disse ter ficado impressionado com a riqueza do processo, anotou títulos de livros que sugeri e que tratavam, naturalmente, de problemas associados à sua carreira. Ao se despedir, prometeu pensar sobre o assunto. Dias depois, ele me telefonou, a fim de saber se era possível conduzir o processo de outplacement em outra empresa de consultoria e tão logo estivesse empregado, contratar os serviços de Coaching Executivo da Gutemberg Consultores.

Por entender que não fazia sentido seu questionamento, uma vez que os serviços de outplacement da Gutemberg Consultores o beneficiaria duplamente, disse-lhe não ser possível contratar nossos serviços nos termos sugeridos.  Ele, educadamente, agradeceu e prometeu me enviar um livro de presente. Aguardo o cumprimento da promessa até hoje.

Meus leitores indagarão: o que você quer comunicar com esse episódio? A resposta é simples: o profissional não estava preparado para discutir assuntos que fatalmente o tirariam da “zona de conforto” e, consequentemente, provocariam dor. Talvez desejasse apenas operacionalizar a própria recolocação – conquistar novo emprego – e não se beneficiar das lições e aprendizados proporcionados pela própria demissão e, muito menos, corrigir aqueles pontos que podem comprometer a estabilidade, estrutura e progresso da carreira, hoje e no futuro.

Reconheço que há consultores que divergem frontalmente de minhas posições e dizem que essa não é a melhor hora para se tratar de questões delicadas da carreira e da vida pessoal, em virtude da fragilidade psicológica pós-demissão. Isto é, eles preferem que os profissionais voltem às empresas apenas envernizados e com respostas superficiais aos problemas identificados, mesmo quando incapazes de identificá-los. É o caminho mais fácil e, certamente, o mais rentável. Todavia, o menos construtivo para a vida e a carreira.

Esse tipo de posicionamento assemelha-se ao do médico que, ao receber um paciente enfartado, diz: essa não é a melhor hora para discutir o problema do paciente, tomar decisões corajosas, rápidas e, muitas vezes, radicais – submeter o paciente a uma intervenção cirúrgica –, falar abertamente com família sobre a gravidade do problema, entre outras questões.

Naturalmente, não quero que meus leitores pensem que desejo, de maneira simplória, policialesca e irresponsável, esconder ou mesmo maquiar os seus efeitos sobre os indivíduos. Isto seria ingenuidade, falta de espírito crítico ou, simplesmente, ignorância. Desejo apenas realçar as lições que os profissionais, homens e mulheres, podem aprender com ela. Essas lições vão muito além do simples aprendizado sobre a importância de networking, da elaboração de um curriculum vitae e do aprendizado sobre técnicas de entrevistas. Elas dizem respeito às verdadeiras mudanças que ocorrem em seu interior – de valores, atitudes, comportamentos, e até mesmo na maneira de pensar. Em síntese, uma mudança radical de vida – “Uma verdadeira transformação da mente”.

O testemunho de Paulo Leite, ex-diretor da Canavialis (Grupo Votorantim), exemplifica nossa tese – “O importante neste período é aproveitar o tempo para uma cuidadosa revisão de vida, que deve ser utilizada para não se repetir os mesmos erros no futuro. E a volta ao passado deve terminar por aí. As horas (ou seriam dias?) de conversas e orientações com os competentes profissionais da consultoria têm de ser cuidadosamente guardadas e aplicadas no dia-a-dia futuro da vida dos executivos que tiveram essa oportunidade. Deve ser também uma oportunidade valiosa para se desenvolver novos e saudáveis hábitos, físicos e intelectuais, que contribuam para melhorar o desempenho na vida profissional e pessoal. Quem souber aproveitá-la, nunca mais será o mesmo. Nem sua carreira profissional”.

Nesse momento é bom manter sempre em mente a advertência da sabedoria gerencial norte-americana: “As you move up the ladder, you´re not paid for what you have done in the past. You get paid for what you are going to do in the future”.

Agora, indagamos: Como transformar a demissão no melhor fato ocorrido em sua vida?

À luz de meus estudos, pesquisas e experiência, eis algumas sugestões que considero vitais:

Primeiro – Quando você for demitido, nunca assuma a demissão como ato contra você. Ela representa apenas o julgamento de uma pessoa, seu chefe, e não da organização como um todo. Portanto, não canalize nem desperdice suas energias de maneira negativa. Pense nas palavras de Michael Bloomberg, imediatamente após sua demissão: “Stop It Right There! No, I’m not going down that path even in my mind… Let’s get on with it…. Here’s where you are today. What do you do next?” Ou ainda, no conselho dado a Lee Iacocca por sua mulher: “Don’t get mad. Get even”.

Segundo – Aceite a demissão com naturalidade, como qualquer outro evento de sua vida – nascer, brincar, crescer, estudar, namorar, casar, adoecer, envelhecer, morrer etc.

Muitos profissionais sofrem de maneira irracional a dor de uma demissão simplesmente porque confundem a vida com a própria carreira ou trabalho.

A carreira não é a sua vida e a sua vida não é o seu trabalho. Reflita sobre as palavras da famosa médica norte-americana, doutora Bernadine Healy, ex-presidente da Cruz Vermelha, após sua demissão: “I did the best I knew how and what I believed to be right for an organization I came to love. It was heartbreaking, but I was then, and still am, proud to have served during that time…”

Terceiro – Nunca abdique de seus sonhos, por maiores que sejam os obstáculos a serem vencidos.

Como escrevemos, em trabalho anterior, em vez de personalizar um acontecimento e tirar conclusões apressadas e desalentadoras sobre você mesmo ou sobre sua demissão, crie novos sonhos. Você se tornará aquilo que pensa. Os profissionais que admiramos são aqueles que procuram superar os problemas sem nunca perder a força mágica de seus sonhos.

Quarto – Se você é o agente responsável pela própria  demissão,  reconheça o fato sem se ater aos erros do passado. Não faça como a grande maioria de demitidos que se auto-enganam ao atribuir a terceiros a responsabilidade pelos próprios erros e enganos.

Ao contrário, corrija-os e siga em frente. Não perca tempo olhando para o passado. Os vencedores não olham para trás. Eles enfocam apenas o futuro. Medite as palavras de Harry Truman, ex-presidente dos Estados Unidos: “As soon as I realize I’ve made one dammed fool mistake, I rush out and make another one”.

Quinto – Veja-se assumindo uma nova posição, igual ou superior, à que ocupava anteriormente. Trabalhe duro – 12 a 14 horas por dia – e não desperdice nenhuma oportunidade que se apresente no competitivo mercado de trabalho.

Sexto – Nunca queime as pontes, por maior vontade que sinta de destruí-las – “Romper com o passado” – após uma demissão, seja ela bem ou mal conduzida. Você, com toda certeza, necessitará delas amanhã.

As suas referências, pessoais e profissionais, fornecidas por seus ex-empregadores são imprescindíveis no momento de nova contratação. Infelizmente, muitos indivíduos perdem excelentes oportunidades de trabalho simplesmente porque não dão importância a essa questão.  Nunca se esqueça dessa verdade: “Seu sucesso dependerá, em grande parte, de sua reputação” – esse é o seu capital mais valioso.

Sétimo – Tire proveito de sua transição e cresça em todos os ângulos de sua vida – pessoal, profissional, familiar, etc.

Ignore o exemplo daqueles profissionais que, uma vez demitidos, pensam apenas na recolocação, porém não aprendem absolutamente nada com ela. Eles encaram a demissão como algo negativo e nunca pensam nos benefícios que ela proporciona. E, o pior, eles voltam, em geral, às empresas, com os mesmos vícios, valores, vulnerabilidades, estilos gerenciais obsoletos e desprovidos de cultura humanística e gerencial.  Eles desprezaram um período precioso de suas vidas – o momento da transição de carreira – para pensarem com profundidade sobre os aspectos que motivaram sua demissão, e então, empreenderam as mudanças necessárias e fazer valer seus objetivos, valores e sentimentos que verdadeiramente agitam e movem suas carreiras.

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